Os mais crentes neste Benfica de Bruno Lage poderiam dizer que quatro vitórias em quatro jogos – e com resultados confortáveis – eram cartão-de-visita suficiente para aferir o que ali se tem feito. Os mais cépticos poderiam argumentar que defrontar Santa Clara, Estrela Vermelha, Boavista e Gil Vicente não é propriamente um medidor fiel do nível da equipa para o estatuto que quer ter. Talvez a razão estivesse entre as duas teorias e era nessa medida que o duelo frente ao Atlético de Madrid era uma prova de factos, mas se tornou uma prova de vida. E o Benfica deu ambas.
Nesta quarta-feira, o triunfo por 4-0, na segunda jornada da Liga dos Campeões, não foi apenas uma vitória – e não foi sequer fruto de “artes menores” como a inspiração individual, a fortuna no jogo e a fragilidade do adversário.
Os portugueses foram fortes a definir zonas de pressão alta, a defender bem em bloco baixo, a tirar a bola de zonas congestionadas e a lançar transições. E também a marcar golos, que parecendo que não também são importantes.
Em suma, a equipa fez um pouco de tudo e o Atlético fez pouco mais do que nada. Esta era a prova de vida que o Benfica de Lage ainda não tinha dado, chegando aos seis pontos em dois jogos. E os 4-0 poderiam ter sido cinco, seis ou sete.
Soluções novas
Na antevisão do jogo, Bruno Lage ainda tentou desenhar um blefe para enganar Simeone, lembrando-se de algo que não tinha passado pela cabeça de ninguém: a possibilidade de Di María jogar à esquerda e Akturkoglu à direita. Dificilmente Simeone levou a sério.
Mais a sério foi aquilo que Lage fez com os preceitos tácticos da equipa. Foi interessante a saída de bola a três, com Carreras como central e Bah projectado no lado oposto – algo pouco visto neste Benfica, mas que permitiu ao espanhol destacar-se na verticalização de bolas através do passe. Um pouco como já chegou a fazer Nuno Mendes na selecção, com resultados interessantes.
Neste jogo, o Benfica aproximou-se bastante mais do 4x3x3 nesta partida, com Aursnes a jogar como médio-interior e não tanto como um híbrido entre médio-interior e segundo avançado – algo que faz sentido por o Benfica não passar tanto tempo em ataque posicional como na I Liga. E isso deu à equipa um bloco de pressão aparentemente mais coeso, por não haver tanto desdobramento do norueguês.
Aos 13’, a boa pressão do Benfica deu frutos. Pressão alta com seis jogadores na meia-direita e quatro na zona da bola, algo que ainda é um resquício do que trabalhava Roger Schmidt e que naturtalmente Lage não deita fora.
Aursnes recuperou a bola e serviu Akturkoglu, que aproveitou o bizarro alheamento de Witsel, que nunca viu que tinha um adversário para marcar e se focou apenas na bola.
Este golo cedo obrigou o Benfica a defender bastante e também aqui fez algo novo, mas que dificilmente será replicado com adversários mais frágeis: a defesa em 5x3x2, com Akturkoglu bem baixo como lateral e Di María na frente a “descansar” a ganhar energias para o ataque seguinte.
Apesar de tantas novidades tácticas e estratégicas, tudo pareceu bastante orgânico e equilibrado, com a equipa muito certinha em bloco baixo, muito consciente nos momentos de pressão alta e a ter muita capacidade de tirar a bola das zonas de pressão – Carreras ofereceu técnica, Florentino e Akturkoglu com rapidez na decisão e Pavlidis muita qualidade em apoios frontais. A bola saía quase sempre “limpa” e permitia ao Benfica jogar.
O perfil da partida dava muita bola ao Atlético – ainda que sem perigo – e também possibilidades variadas de transições, que o Benfica foi definindo mal. Foram três, sendo que uma delas deu falhanço de Pavlidis, isolado, já perto do intervalo.
VAR chamou para penálti
Ao intervalo, Simeone lançou três jogadores, um deles um ponta-de-lança mais fixo, Sorloth, provavelmente contando que o Benfica manteria o bloco baixo. E lançou também Gallagher, jogador com maior “perfume” a ver o jogo de frente.
O resultado prático foi nenhum, até porque aos 50’ Pavlidis foi pisado na área, o VAR chamou o árbitro e houve penálti para Di María converter em golo. O argentino ainda esteve perto do 3-0 pouco depois, numa transição mal finalizada.
Nesta fase era fácil entender o jogo. O Atlético estava balanceado para o ataque e o Benfica, a defender em bloco baixo, tentava sair em transições com Di María e Akturgoklu.
O Atlético, apesar de largos minutos em ataque posicional, era profundamente incapaz de criar – em parte por falta de engenho, em parte por especial capacidade “encarnada” de ocupar os espaços na sua defesa baixa. Não havia nada a fazer – menos ainda depois do cabeceamento de Bah para o 3-0, num canto bem batido por Beste, e do penálti de Kokçu para o 4-0.