Como o rapaz gostava de homus, perguntei-lhe se gostava de grão, e ele disse que sim. Chegou o meu bacalhau e ele quis provar o grão. Temperei-o com azeite e dei-lhe uma garfada.
Não gostou. Disse que estava rijo, que não sabia a nada. Vi logo porquê: faltava-lhe o óleo de sésamo, e o alho, e o sumo de limão. Tentei ver o grão da perspectiva do homus e, de facto, é como criticar um vinho tinto do ponto de vista da sangria.
O pior é que acontece com o grão o que acontece com os tintos que vão para a sangria: passa a ser menos importante que seja bom, porque já não precisa de se aguentar sozinho.
Ora, já é difícil arranjar grão português bom e novo. As pessoas habituaram-se ao de lata, que não é nada mau. Mas as sopas de grão feitas com grão de lata não têm nem o mesmo sabor nem a mesma amplitude possível de texturas.
Há quem triture o grão em pedra para fazer sopa na Bimby – e também fica bom. Há qualquer coisa de divino no grão: fica sempre bem, o moço. Mas é triste haver uma geração para quem o grão é apenas um ingrediente do homus. É triste que não saibam reconhecer a planta do grão quando mostramos uma fotografia. É triste não saberem quando é a colheita.
Fazer homusque é tão vasto e difere tanto de casa para casa, pensam que sabem tudo: até acham que há uma maneira correcta e incorrecta de o fazer. Mas do grão não sabem nada. E se fosse só o grão… Com o bacalhau, é a mesma coisa. Já é difícil apanhar um bacalhau cozido num restaurante. Dá mais jeito disfarçá-lo com lagareirices, para não se perceber que não presta.
Os pratos de mistura, como os pastéis de bacalhau e o homusinventam-se para aproveitar os ingredientes que não são da melhor qualidade. São uma maneira de respeitar os ingredientes de primeira qualidade, que se servem com a simplicidade que merecem.
Qualquer dia, as pessoas que gostam de pipocas ficam assustadas quando alguém lhes mostra uma espiga de milho. O grão dá um livro grande: o homus só dá um capítulo.